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Terra-longe

Brito-Semedo, 25 Out 16

 

Barco_1.jpg

 

 

A emigração é um tema serôdio na vida do homem cabo-verdiano, tendo tido o seu início ainda nos finais do século XVII e sido mantido até hoje. Este fenómeno parece ser a solução a que a população recorre para a escassez sistemática dos recursos das ilhas.

 

Três poemas de épocas diferentes sobre a emigração cabo-verdiana:

 

 

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Dr. Arnaldo França Faleceu Há 1 Ano

Brito-Semedo, 19 Ago 16

  

Arnaldo França.jpg

 

Arnaldo Carlos Vasconcelos França

 

Praia, 15.Dezembro.1925 – 18.Agosto.2015

 

 

O Esquina do Tempo teve acesso às cópias dos textos disponibilidades pelo Dr. Arnaldo França à Doutora Amália Melo Lopes por ocasião da Semana da Língua Materna 2012  na Uni-CV (uma delas tem assinatura, tornando-se, por isso, uma preciosidade), que os digitalizou, sendo validados por ele. Alguns destes textos terão sido publicados no jornal A Semana.

 

Um bem-haja e um agradecimento especial à Professora Amália Melo Lopes pela cedência deste material.

 

 

ABANDONO OU FADO PENICHE

 

David Mourão-Ferreira

 

 

«Por teu livre pensamento

Foram-te longe encerrar.

Tão longe que o meu lamento

Não te consegue alcançar.

E apenas ouves o vento.

E apenas ouves o mar.

 

«Levaram-te, era já noite:

a treva tudo cobria.

Foi de noite, numa noite

de todas a mais sombria.

Foi de noite, foi de noite,

e nunca mais se fez dia.

 

«Ai dessa noite o veneno

Persiste em me envenenar.

Ouço apenas o silêncio

que ficou em teu lugar.

Ao menos ouves o vento!

Ao menos ouves o mar!»

MORNA TARRAFAL

 

Versão crioula de FADO PENICHE, de David Mourão-Ferreira

 

Mó bu cabeça ê sim dono

És fitchabo longi bu casa.

Nim nha tchóro, nim nha grito

Ca ta tchiga djunto bó.

É só mar qui bu ta ôbi.

Bu ca t´ôbi más qui bento.

 

És lebabo nôti fitchado,

Nôti sucuro di treba.

Era nôti cima agôro,

Nôti nim ano di fome.

Era nôti, era nôti,

Ti hoji inda ca manchê.

 

Veneno qu´ês da-m´quêl nôti

Ti góci ê´sta-m´ na sangui.

Na casa, na bu lugar

Só basio fica co mi.

Bó ao menos bu tem bento.

Bó ao menos bu tem mar.

  

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Homenagem à Rua de Côco d'Outrora

Brito-Semedo, 29 Mai 16

 

Rua de Coco.jpg

Rua de Coco (Foto actual)

 

 

Na Rua de Côco tem um cruz na mei de rua
Ondê tud menine ta jegá botom e dupatrão
Tem loja de Pudjim que ta pagode pa mês
Tem nh’Antonha Solidade que ses rubesode
E que tude menine ta passá pau
Tem bar de nha Nizinha ondê que Tchuff, Nho Djuquinha,
E também Bana, menine de Rua de Côco, ta cantá
Tem casa de Mané Cantante, que tem horta na Rebera Julion
Que ses almoço dominical que B.Leza e Moxim de Monte


Na Rua de Côco tem figuras célebres de marinheiros, de navegadores
Mas também grandes desportistas e figuras de respeito, gente nobre,
Tem Dedenche, nha Gadjome, nha Mar’inceta, Nho Tino, Nha Tina,
Nha Bidjuta, Nha Puldina, Bia de Guida, Nho Jom Miranda,

Fernando de Pudjim, e mas gente que já-me esquecê.

 

Na Rua de Côco ta passá gente pa tcheu camim:
Uns ta bá baia pa trá um dia de traboie
Otes cansode de vida na camim de cemiter
Que música ô sem música sês destine ta passá pa Rua de Côco.
Tem procissão dum qchada de sonte
Ma também tem massongue
Tem casa pa trá espirte rum
Educá bo alma
E traze-be dignidade.

 

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- José Pereira, 51 anos, natural do Mindelo. Fotógrafo da Natureza e amante da Poesia dá a conhecer aqui na Esquina do Tempo um seu projecto de livro onde junta essas duas paixões.

 

 

 

 

 

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Poeta Escritor

 

Não poderá haver qualquer engano naquilo que escrevo, 

escrevo sobre mim mesmo,
apesar de nisto tudo estar patente o meu paradoxo existencial
na verdade… não sei escrever
há um outro ser em mim…um outro eu
esse, desde miúdo achou-se escritor poeta
escreve sobre mim coisas que muitas vezes nem sequer entendo
diz que sou uma pessoa triste e escreve sobre essa amargurada tristeza
confunde-me em rimas e sentidas abstracções,
como se a minha vida fosse um jogo de palavras
mas no fim… reserva-me sempre um final feliz
deixa-me uma palavra de esperança.
E apesar de toda a presunção do que sobre mim escreve julgando-me conhecer
Gosto deste poeta que habita em mim.

 

- Zé Pereira

 

 

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Dia claro.jpg

Foto Daniel Monteiro Júnior

 

 

Quando do fundo da noite vier o eco da última palavra submissa

E a patina do tempo cobrir a moldura do herói derradeiro,

 

Quando o fumo do último ovo de cianeto
Se dissipar na atmosfera de gases rarefeitos
E a chama da vela da esperança
Se acender em sol na madrugada do novo dia

 

Quando só restar na franja da memória
Lapidada pelo buril dos tempos ácidos
A estria da amargura inconsequente
E a palavra da boca dos profetas
Não ricochetear no muro do concreto
Da negrura sem fundo de um poço submerso

 

Sejais vós ao menos infância renovada da minha vida
A colher uma a uma as pétalas dispersas
Da grinalda dos sonhos interditos.

 

Arnaldo França, in Claridade, n.º 9,  Dezembro de 1960

 

 

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Corsa.jpg

 

Corsino António Fortes

 

São Vicente, 14.Fev.1933 - 24.Julho.2015

 

 

Capitão das ilhas

 

Morreu hoje o capitão de um navio das ilhas.
Não foi porque ele era bom
e puxava afectuosamente o fumo do seu cigarro
quando falava comigo
que fui ao seu enterro.


Nem tão-pouco porque conheci
as tragédias náuticas
que serviram de alicerce ao único poema,
entre flores e caiado de branco,
que ele escreveu nesta vida.


Fui ao seu enterro porque sou caçador de heranças
e queria confessar a minha gratidão
pela riqueza que ele deixou,
pela sua dimensão desmesurada do mundo
e pela sua incorporação no veleiro em que todos navegamos.

 

- Osvaldo Alcântara

 

in Cântico da Manhã Futura, 1986

 

Corsino Fortes.jpg

 Foto Carlos Fortes Lopes

 

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Corsino_Fortes.jpg

 

               I

 
Nas rugas deste homem
Circulam
estradas de todos os pés que emigram
Quebram-se
vivas! as ondas de todas pátrias
Anulam-se
de perfil! as chinas de todas muralhas

Na mão bíblica
No humor bíblico deste homem
crepitam de joelhos
Desertos & catedrais
Onde
deus & demónio
jogam
                   noite e dia
             a sua última cartada
E do pó da ilha à mó de pedra
Não há relâmpago
Que não morda a nudez deste homem
Nudez de liberta!
Que a dor germina
E o espaço exulta
E pela ogiva
ogiva do olho
Não há poente
Que não seja
Uma oração de sapiência

 

 

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Soncent.jpg

Foto autor desconhecido. Crédito Soncent (Mindelo), FB

 

 

Quê um tem por mim

Soncent é um pedra de cristal

Mi d' riba del

Mi é nada mas que um pidrinha

 

Ta rola de rotcha em rotcha

Rebêra rebêra sem aga

Quê nôs aga ba pa mar

 

Levanta pidrinha de Soncent

Na mundo ondê quêl parcê

Procura na sê lugar

Um puntim de luz de claridade

Um puntim de luz de claridade

Que ta da pa lumia terra

 

– Jorge Humberto

 

Jorge Humberto.jpeg

 

 

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 Viagem de Vasco da Gama à Índia: 8 de Julho de 1497 a 20 de Maio de 1498

 

 

Tradução em Crioulo, variante da ilha de Santo Antão, do Canto 5.º, Estâncias VIII e IX, d’ Os Lusíadas, datada de 1898, de autoria de um dos mais ilustres filhos dessa ilha, o Cónego A. da Costa Teixeira, que foi editor do Almanach Luso-Africano (S. Nicolau, 1895 e 1899) e da revista literária A Esperança (S. Nicolau, 1901) e autor da 1.ª cartilha caboverdiana: Cartilha Normal Portuguesa (Porto-Cabo Verde, 1902), destinado ao "Ensino primário completo".

 

O texto está datado de 5 de Maio de 1898 e assinado com a indicação do autor ser “Caboverdiano”:

  

VIII

 

Depôs que nô passá quês îa Canária,

Q'otr'óra ês dá nôme de Furt'náde,      

Nó'ntrá tá navegá lá pa quês ága

Quês térra onde mute maravia nôve

Nosse navi de guêrra j'andá t'oiá:

Lá nô ribá c'um vintim favoréve

Pa nô t'mésse na quês térra mantmente.

 

IX

 

Nòs antrá na pôrte d'un d'aquês îa,

Q'tmá nôme d'aquêll guerrente'Sam Thiágue,

Sánte q'ajdá mute naçom spanhòl

Fazê n'aquês geste môr mute strágue

D'êi, q'ande soprá um vintim de Nôrte,

Nô torná t'má noss'camim socégáde

Na mêi d'aquêll mar, e assim nô bá d'xande

Quell'terra, onde nô ochá refrésque sabe.

 

Cónego A. da Costa Teixeira, “Chegada Ás Ilhas de Cabo-Verde”, Revista Portuguesa Colonial e Marítima, Lisboa, 1º Ano, 2º Semestre, 1897-1898, p. 566.

 

 

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Topo Coroa.jpeg

Topo da Coroa, Ponto mais alto de Santo Antão

 

 

Sinos de silêncio

ressoam no eco da abóbada

memórias que sonham.

 

“Topo de Coroa”

 

CORSINO FORTES

 

corsino_fortes.jpg

 

 

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